quarta-feira, 13 de maio de 2009

Tragédia em um ato

Velho: Jovem mancebo que apressado cruza as molhadas e escuras ruas desta cidade, terias tu uma moeda de cobre e um minuto de teu tempo para dedicar a este velho? Peço-te a moeda para que eu possa beber a fim de esquecer o futuro que este bruxo previu. O minuto serve para que eu possa recompensar-te por tua benevolência.

Jovem: Quem és tu, errante maltrapilho? Clamas ser um bruxo e que possuis em tua alma o conhecimento do futuro, mas para mim, teus olhos não mostram sabedoria mas insanidade. Porém, possui sorte. Junto a ti está uma criatura temente a Deus e que segue as escrituras. Está escrito que devemos ajudar almas menos afortunadas e por isso que lhe entrego esta moeda. Em respeito à tua velhice, terás minha atenção por um minuto.

Velho: Ah, o velho cobre azinhavrado dos mendigos. A moeda é velha, mas não importa. O hábil alquimista seria capaz de transformar até mesmo esta peça velha e suja no mais puro ouro. Mas a mim, isto também não importa. O que me interessa é o alcool, capaz de aliviar meu sofrimento. E o que te entrego de recompensa? Contarei a ti uma verdade. A paixão é uma tragédia. Se não acreditas em mim, olhai para o passado. Romeu e Julieta se sacrificaram pelo sentimento de um pelo outro. A culpa não foi de nenhum Cappuleto e Montecchios, mas do casal e de seu ingênuo e tolo amor. Da mesma maneira, Édipo seguiu seus sentimentos e cometeu o pior pecado. Amou sua mãe e pagou caro por isso. Para sempre sua vergonha foi lembrada.

Assim, aconselho-te, jovem. Aproveite tua idade, livra-te das rosas que carregas e foge. Vai para longe de amor e te torna um verme, crápula ou cigano. Enquanto fores capaz, corte o coração de belas jovens e endurece o teu. Quando tiver dentro de ti a mais dura rocha, retorna para casa e para tua amada. Teu romance não terás nem de longe a intensidade que possui hoje, mas te livrarás da sina dos heróis e viverás tranquilo por muitos anos.

O jovem olha com desdém para o velho bruxo e segue seu caminho furioso com as palavras. As cortinas se fecham. Entra o bardo.

Bardo: Eis que assim foram as palavras de um bruxo maltrapilho e velho para um jovem apaixonado. Infelizmente, o que se segue é que os jovens acreditam que são os donos da verdade e o nosso herói não escuta o sábio bruxo. Então, segue à casa de sua amada e a encontra nos braços de outro. As cenas que sucedem são de derramamento de sangue e ódio. Deveras, o herói ainda viverá por muitos anos, porém, carregará para sempre a amargura daquele momento e as palavras do velho bruxo naquele breve encontro.